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Carta aberta aos candidatos à Presidência da República

O Sindicato Nacional dos Editores de Livros enviou uma carta aberta para os candidatos que ocupam os três primeiros colocados nas pesquisas de intenção de voto para a Presidência da República: sras. Dilma Rousseff e Marina Silva e o sr. Aécio Neves. Os respectivos protocolos de recebimento por parte dos candidatos foram enviados para o…

O Sindicato Nacional dos Editores de Livros enviou uma carta aberta para os candidatos que ocupam os três primeiros colocados nas pesquisas de intenção de voto para a Presidência da República: sras. Dilma Rousseff e Marina Silva e o sr. Aécio Neves. Os respectivos protocolos de recebimento por parte dos candidatos foram enviados para o SNEL no dia 9 de setembro de 2014.

Veja a íntegra do documento:

CARTA ABERTA AOS CANDIDATOS À PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA

No momento em que os brasileiros estão diante de escolhas vitais para os destinos do País, o Sindicato Nacional de Editores de Livros-SNEL, associação representativa da classe fundada em 1941, com mais de 400 associados espalhados por este Brasil, vem manifestar aos ilustres candidatos ao mais alto cargo da Nação a sua convicção de que, embora a indústria editorial brasileira tenha alcançado uma importante dimensão econômica, o livro não é apenas um bem material. Ele é alicerce da vida cultural do país, agente de transformação, fonte de conhecimento e prazer e incomparável instrumento para a construção da identidade de pessoas e nações.

O poder de transformação da palavra escrita é revestido de relevância ainda maior num país como o nosso, de dimensões continentais e grandes desigualdades. Os editores de livros estão conscientes de suas responsabilidades e irmanados com todos os brasileiros no esforço de construção de uma sociedade vital, próspera e justa, com uma produção cultural que reflita a diversidade e a riqueza das nossas origens e particularidades.

A indústria editorial cresceu, se diversificou e se consolidou nestes nos últimos vinte anos. Este desenvolvimento ocorreu em um ambiente marcado por profundas mudanças, resultantes de fatores diversos; entre estes, a inovação tecnológica, a incorporação de novos segmentos de consumidores e o aumento da competição.

O setor compreende que o aumento do número de consumidores, fruto da estabilidade econômica e da incorporação de milhões de brasileiros às classes médias ocorridas nas últimas décadas, representa um desafio e uma oportunidade, e reagiu a estas mudanças aumentando a cada ano o número de novos títulos publicados, foram 62.235 publicados em 2013 e, ao mesmo tempo, reduzindo substancialmente o preço médio dos livros no País. Segundo pesquisas anuais realizadas pela FIPE-USP, o preço médio do livro no Brasil, descontando a inflação, caiu 43,8% entre 2004 e 2013.

O setor também vem aproveitando as oportunidades oferecidas pela transformação tecnológica. Hoje existem mais de 35 mil títulos oferecidos em formato digital no Brasil e este número cresce de maneira acelerada. As vendas de livros no formato digital também aumentam. Hoje, já representam 3.5% do mercado e devem chegar a 10% nos próximos dois anos.

Em que pese estes processos que evidenciam a vitalidade e maturidade do setor, a indústria editorial também enfrenta obstáculos e desafios que exigem a atenção e a ação, não apenas do setor, mas de toda a sociedade.

Uma das questões que preocupam o setor são propostas bem intencionadas, porém profundamente equivocadas, de alterações na Lei do Direito Autoral. Estas propostas limitam o direito do autor de dispor sobre o que ele produz. Vivemos na era do conhecimento. A produção da informação e do conhecimento é vital para o desenvolvimento das pessoas e das nações nos dias de hoje. É preocupante que, enquanto nas sociedades mais dinâmicas e desenvolvidas os governos e as instituições se movem para estimular e proteger a criação intelectual, no Brasil, alguns defendem um movimento contrário. Se as propostas equivocadas forem adotadas a nossa produção acadêmica seria seriamente afetada e corremos o risco de que nossas universidades e alunos tenham que usar, cada vez mais livros, produzidos em outros países, nos quais a produção intelectual é protegida e estimulada.

O número de universitários brasileiros dobrou nos últimos dez anos. No mesmo período, graças às cópias não autorizadas, a produção de livros técnicos e científicos caiu pela metade. Diante deste quadro, é fundamental que a sociedade e o poder público se conscientizem da importância de proteger a criação intelectual o direito do autor, seja ele um acadêmico, cientista, pesquisador ou romancista.

Outra questão que exige um posicionamento firme de editores, governo e da sociedade em geral é a proibição das biografais não autorizadas. Hoje, somos a única democracia no mundo na qual os cidadãos são privados do direito de conhecerem os protagonistas de sua história.

É apropriado que a lei proteja o direito à privacidade, mas este direito deve ser complementado pela proteção do acesso às informações de relevância para a coletividade, na forma de tratamento distinto nos casos de figuras de dimensão pública, os chamados protagonistas da história: chefes de estado e lideranças políticas, grandes nomes das artes, ciências e dos esportes.

Na maioria das sociedades de alto nível educacional, a possibilidade da coletividade de conhecer quem foram seus grandes nomes, o contexto em que viveram e a forma como construíram suas vidas é expressamente resguardado por lei. No Brasil, em contraponto, há inúmeros exemplos de condenações em processos judiciais que impedem que autores de reconhecida seriedade publicassem obras sobre grandes brasileiros, tais como Garrincha, Roberto Carlos e Vinicius de Moraes.

Importante frisar que a reclamação contra estas obras não foi fundamentada em qualquer erro, distorção ou lacuna no conteúdo das referidas obras. Não estava em discussão a qualidade da pesquisa ou a fidelidade da informação. Aliás, esta qualidade estava implicitamente reconhecida. A argumentação dos reclamantes ou de seus descendentes era, simplesmente, que não haviam autorizado e queriam, porque a lei brasileira assim o faculta, proibir a publicação de qualquer informação biográfica.

Vale relembrar que falamos do direito de publicar apenas a verdade, comprovada e documentada. O setor editorial concorda plenamente que no caso de publicação de informações inverídicas, autores e editoras devem responder pelos seus atos.

A liberdade de pesquisar, escrever e publicar a verdade sobre a vida dos grandes brasileiros é vital para a difusão do conhecimento da nossa história e a formação de uma identidade genuinamente brasileira. A lei que permite censura à biografia não autorizada precisa ser urgentemente remediada, antes que o prejuízo à construção da nossa identidade cultural seja permanente.

Uma terceira questão que suscita a preocupação da indústria editorial e tem relevância para a sociedade como um todo, é a forma como devem ser aplicadas as normas legais concebidas para o livro no formato tradicional, impresso, aos novos formatos que surgiram com a evolução tecnológica e digital.

A sociedade brasileira compreende o papel crítico do livro na formação da cultura nacional e na disseminação do conhecimento. Esta convicção está refletida na Constituição Brasileira desde 1967, que assegura a imunidade tributária ao livro, como mecanismo de incentivo à educação e o desenvolvimento de uma sociedade mais próspera e mais justa.

Está claro que a imunidade definida na Constituição não foi adotada para incentivar o consumo de papel, e sim, a disseminação da cultura e do conhecimento. Ou seja, o que a Constituição protege é a informação e a arte; o conteúdo dos livros. Por este motivo, é lógico e necessário que a imunidade tributária ao livro se estenda à sua versão digital, que tem o mesmo conteúdo e a mesma capacidade de educar e transformar, que a versão tradicional, impressa.

Para tal, é fundamental a aprovação do Projeto de Lei ora em tramitação no Congresso que atualiza o conceito do livro, e também que os processos que tramitam no Supremo Tribunal Federal sobre a questão tenham resultados consistentes com o entendimento correto sobre a abrangência da imunidade do livro.

E finalmente, o Sindicato Nacional de Editores de Livros quer propor aos candidatos à Presidência e à sociedade como um todo, que se inicie um debate amplo e fundamentado sobre as experiências bem sucedidas em países como Alemanha, França e Espanha na adoção da chamada Lei do Preço Fixo. Esta norma legal visa incentivar a diversidade, não apenas na produção editorial, mas também na sua distribuição e comercialização. Ela busca evitar que uma concentração extrema, inviabilize a existência de livrarias independentes, pequenas e médias, seja nas grandes cidades como no interior, parte fundamental da cadeia do livro.

O sucesso desta Lei nos países citados expressa a visão, citada na abertura desta carta, de que o livro, receptáculo da arte e do conhecimento, tem dimensão cultural e social que transcende o seu valor material.

A indústria editorial do livro, representada pelo Sindicato Nacional de Editores de Livros, se coloca à disposição dos candidatos e de suas equipes para aprofundar a discussão dos pontos abordados nesta carta, assim como de outras questões relevantes para o setor e a sociedade, sempre visando o desenvolvimento justo e vigoroso do nosso País.

Atenciosamente,

SÔNIA DA CRUZ MACHADO DE MORAES JARDIM
Presidente do SNEL

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