skip to Main Content

Ficha Catalográfica: o ‘pilar invisível’ da estrutura editorial do Brasil 

Ferramenta organiza livros garantindo acesso ao conhecimento e ampliando a visibilidade das obras

A ficha catalográfica, aquela pequena tabela geralmente encontrada no verso da folha de rosto de um livro, é essencial para qualquer publicação editada e comercializada no Brasil. Não apenas essencial, mas obrigatória, determinada pela Política Nacional do Livro (Lei n. 10.753/03). Tal quadro organiza e padroniza as informações bibliográficas, facilitando a identificação e o acesso aos livros em bibliotecas, livrarias e centros de informação. No entanto, apesar da sua importância, sua presença ainda é desconhecida por muitas pessoas e instituições.

No setor de catalogação do Sindicato Nacional dos Editores de Livros (SNEL), duas bibliotecárias são responsáveis por tornar cada livro brasileiro devidamente catalogado. Gabriela Faray e Meri Gleice Souza talvez sejam duas das pessoas que mais aparecem em livros no país. Gabriela já teve seu nome impresso em cerca de 4 mil livros. Já Meri Gleice, provavelmente em um pouco mais de 21 mil obras. Isso porque cada uma das fichas carrega o nome de quem a produz, o que mostra o tamanho da responsabilidade que carregam em cada processo.

Ambas advogam para que a ficha catalográfica não seja encarada apenas como uma obrigatoriedade legal, mas uma ferramenta de organização que torna a obra única e facilmente rastreável no mercado editorial. “Este é um instrumento que ajuda a todos no mundo do livro”, diz Gabriela.

Em destaque: modelo de ficha catalográfica comumente visto no verso da folha de rosto

 

Certidão de nascimento

A ficha é um conjunto de códigos que funciona como uma espécie de certidão de nascimento. “A ficha catalográfica reúne todas as informações descritivas do documento, como autor, título, editora, ano, páginas e ISBN, formando o controle biográfico essencial para a organização de acervos em nível nacional”, explica Robson Freitas, professor de Biblioteconomia da UFRJ. A ficha também apresenta uma representação temática, organizando os assuntos principais da obra por meio de descritores e números de classificação, como o Sistema Dewey (CDD) e o Sistema de Classificação Universal (CDU), que, nas bibliotecas, atuam como os sistemas de classificação de documentos mais relevantes.

Para as editoras e os autores, o processo de criação de uma ficha catalográfica segue etapas rigorosas, justamente com o intuito construir uma padronização que facilita a integração do livro em sistemas de informação de bibliotecas e livrarias. Esse processo conecta o leitor à obra de forma eficiente e permite a expansão de acesso ao conhecimento por meios variados.

O SNEL foi pioneiro ao oferecer o serviço de catalogação online em 2013, além de incorporar QR codes como medida de segurança e autenticidade : a partir da implementação desses códigos, cada obra recebe uma certificação específica, em formato de QR code, o que impede fraudes, cópias e assegura a originalidade do documento. Com tais recursos, editoras e autores conseguem obter a ficha catalográfica e inseri-la diretamente na diagramação de suas publicações.

Explicação de cada termo que compõe uma ficha catalográfica

Impacto na distribuição e comercialização

A ficha catalográfica vai além de seu papel organizacional: ela impulsiona a distribuição e a comercialização de livros. Isso ocorre porque muitos sistemas de bibliotecas e livrarias contam com campos específicos para os dados catalográficos das obras, que formam o conjunto de metadados, o que facilita a inclusão do livro em catálogos digitais, premiações literárias e feiras, como a Bienal do Livro Rio, que é organizada pelo SNEL em parceria com a GL Events.

Os metadados – assim chamados por conter informações mais detalhadas do que dados – que são catalogados nas fichas se tornam fundamentais para autores independentes e editoras menores porque sinalizam o profissionalismo da obra e aumentam sua visibilidade no mercado. Em um cenário com ampla concorrência, essa padronização confere um “selo de autenticidade”, o que torna o livro mais atrativo para leitores e compradores .

Além disso, o professor Robson Freitas ressalta que a ficha catalográfica beneficia toda a cadeia produtiva do livro. “A ficha facilita a organização e recuperação da obra em bibliotecas, permitindo que os leitores encontrem facilmente as obras de autores que conhecem ou temas que buscam”, defende. Ele compartilha um exemplo pessoal, revelando que consulta a ficha catalográfica dos livros em livrarias para entender a temática e outros detalhes da obra antes de comprá-la. Esse hábito é comum também entre seus alunos que utilizam as fichas para referências acadêmicas, contribuindo para a produção científica.

O papel da ficha catalográfica na Lei do Livro

Apesar de estarem presentes mundo à fora, as formas da ficha catalográfica, com determinadas nomenclaturas, aplicação e sistemas de padronização variam conforme as diretrizes bibliográficas e culturais de cada região. No Brasil, a ficha é destacada como uma obrigatoriedade segundo a Lei do Livro (Lei nº 10.753/2003). Esse documento, por sinal, é um marco na democratização do acesso à leitura no Brasil , já que, entre outras medidas, a presença exigida da ficha catalográfica, ao facilitar a busca por livros em bibliotecas e catálogos digitais, é uma ferramenta que ajuda a concretizar um projeto leitor no país.

Outras leis, como as Leis nº 4.084/62 e nº 9.674/98 e resoluções como a Resolução 184/2017 do Conselho Federal de Biblioteconomia, reforçam que a ficha deve ser elaborada por bibliotecários credenciados. Essa exigência profissional é crucial para a integridade do documento, já que uma ficha malfeita poderia comprometer a classificação do livro.

Fichas catalográficas na era digital

Mesmo com o crescimento das publicações digitais, a relevância da ficha catalográfica permanece intacta. No SNEL, as bibliotecárias já trabalham com conceitos de metadados para assegurar que as obras digitais tenham a mesma qualidade organizacional das versões impressas. Segundo as responsáveis pelo serviço, o avanço digital impulsiona novas práticas de catalogação, sempre orientadas pelo compromisso com a organização do conhecimento.

Com o avanço da digitalização, o professor da UFRJ Robson Freitas  acredita que a ficha catalográfica continuará essencial, mas com novas ferramentas, como o formato MARC 21 (Machine-Readable Cataloging), que permite a catalogação digital e a recuperação automatizada das informações. Mesmo em outros formatos e dinâmicas, a catalogação é essencial para a organização e recuperação informacional de obras.” A equipe do SNEL também aponta que o crescimento dos acervos digitais fortalece o papel da catalogação, que se adapta aos novos meios para manter sua relevância.

Um pilar na estrutura editorial do Brasil. Uma peça obrigatória que acompanha as obras, seja no papel ou nos dispositivos digitais. Mesmo com os avanços tecnológicos, a necessidade de organização do conhecimento garante que a ficha catalográfica permaneça indispensável.

Back To Top