
(Por Monica Ramalho* – Especial para o SNEL)
Promovido pelo Sindicato dos Editores de Livros (SNEL), o Rio International Publishers Summit começou nesta quarta, 11 de junho, no Hotel Lagune, na Zona Oeste do Rio de Janeiro. Os quatro painéis do dia visitaram alguns temas e desafios centrais do atual mercado editorial brasileiro com a expertise de especialistas do país e do exterior, que trouxeram dados apurados em pesquisas e impressões obtidas na lida diária sobre as suas áreas de atuação.
Ao dar as boas vindas para cerca de 200 pessoas, o presidente do SNEL, Dante Cid, disse que gostaria que todos “saíssem mais ricos depois de tantas trocas e mais capacitados para tornar o Brasil uma nação leitora”. Logo pela manhã, o secretário Municipal de Cultura, Lucas Padilha, foi prestigiar o evento.
Para o secretário, um leitor apaixonado que compra mais obras do que dá conta de ler, “o livro é o mínimo denominador comum de todas as artes”. Padilha elogiou a Academia Editorial Júnior, uma iniciativa social do SNEL, que está formando a segunda turma de editores, todos universitários que lidam com situações de vulnerabilidade.
Inteligência artificial, audiolivros e mais
Como as instituições estão fomentando a leitura entre adultos que já lêem? De que forma os profissionais da escrita estão fazendo uso da Inteligência Artificial (IA)? Quais são as apostas para o crescimento do mercado de audiolivros no país? Como as editoras, de um modo geral, e os autores estão lidando com os direitos autorais em tempos de IA? Quais inovações tecnológicas estão movimentando o setor?

Os painéis foram desenhados para responder – e também estimular o debate – a essas perguntas. A mesa de abertura, “O poder do livro: Construindo o próximo capítulo da indústria editorial”, reuniu cinco líderes do mercado editorial do país, que conversaram sobre o monopólio das vendas online, puxadas pela Amazon, que oferece descontos impossíveis no preço final do livro, gerando um impacto nas livrarias do país.
“Tudo começa nas livrarias. É ali que os leitores descobrem os livros. Temos que trabalhar por um mercado mais forte e isso passa necessariamente pelas livrarias. São elas que indicam a saúde da indústria do livro”, afirma o livreiro e presidente da Associação Nacional de Livrarias (ANL) Alexandre Martins Fontes.
Presidentes das entidades
Além de Cid e Martins Fontes, a primeira das quatro mesas contou, ainda, com a participação de Sevani Matos, presidente da Câmara Brasileira do Livro (CBL); Lara Kouzmin-Korovaeff, diretora da Liga Brasileira das Editoras (Libre); e Ângelo Xavier, presidente da Associação Brasileira de Livros e Conteúdos Educacionais (Abrelivros). Xavier pontuou que os adultos têm sido estimulados a ler com a expansão de clubes de leitura e saraus literários e destacou a importância de apoiarem iniciativas como essa.
Em seguida, o head da Estante Virtual, André Palme, conversou com Meike Knops, CEO da MVB, empresa alemã provedora de tecnologia e informação. Ela puxou o fio do novelo da IA. “Estamos entregando o nosso conteúdo gratuitamente para a IA. Ela pode ser melhor do que uma pessoa média, mas se estivermos falando sobre novas ideias, sem dúvida, um ser humano ainda se destaca”, avaliou.

Mercado de e-book em alta
O mercado brasileiro de e-book vem crescendo significativamente. Logo após o intervalo para almoço, Palme entrevistou o CEO e cofundador da Bookwire, o alemão Jens Klingelhöfer, um dos grandes investidores no mercado digital global.
“O Brasil é, de muitas formas, um mercado muito especial. Temos que ser muito pacientes e entender que ainda levará um tempo para os audiolivros ganharem espaço. As editoras precisam ser corajosas e investir agora. Sei que é difícil tomar essa decisão pois esse mercado de audiolivros ainda está desabrochando. Os editores brasileiros devem se inspirar em outros mercados, que nasceram e cresceram nos últimos anos. Há grandes chances de o audiolivro ser sucesso por aqui”, previu Klingelhöfer.
IA ou não IA?
Uma conversa à vontade entre os jornalistas Cora Rónai e Pedro Doria arrancou risos da plateia. Colunista do Globo, Rónai assumiu que cada vez usa mais a IA para escrever. “Por enquanto, ela ainda não escreve por nós, mas já é uma ferramenta que uso diariamente. Costumo jogar lá as minhas colunas e peço para a IA checar se usei palavras repetidas e me dar 30 títulos possíveis. Ainda não usei nenhum, mas dentro daquelas sugestões costuma aparecer ideias que não passavam pela minha cabeça”, revela a colunista do jornal O Globo.

Já Doria, criador do Canal Meio, contou que usa o Chat GPT de US$ 200 e não vive sem. “A maneira como leio se transformou bastante nos últimos anos. O meu trabalho começa num diálogo com o Chat GPT. Cresci numa casa com 50 mil livros e logo entendi que não herdaria essa biblioteca do meu avô e do meu pai. Então, as leituras de trabalho são todas feitas no Kindle. Sublinho tudo o que me interessa que vão para um arquivo único, que consulto sempre para trabalhar”.
Direitos autorais e as grandes empresas
Os diálogos do último painel do primeiro dia do Rio International Publishers Summit abordaram um dos assuntos mais polêmicos da atualidade: os direitos autorais versus a apropriação dos conteúdos intelectuais dos autores e das editoras pelas grandes empresas de Inteligência Artificial, como OpenIA, Microsoft, Google e Meta.
“Mais de 40 casos estão pendentes nos tribunais dos Estados Unidos. Temos o caso do New York Times, outro no Getty Image, mais um na França. Há muitos processos legais pendentes e eles costumam levar muito tempo. Ou seja, vai demorar para vermos os resultados desses processos”, avisou Anita Huss-Ekerhult, CEO da IFFRO, uma federação internacional de direitos de reprodução. Presente em 90 países, a IFFRO representa mais de 2 milhões de autores do mundo inteiro.
Neste painel, também estiveram Antonio Murta, representante do escritório Murta Goyanes Advogados; Dalton Morato, diretor jurídico, administrativo e de relações institucionais da Associação Brasileira de Direitos Reprográficos (ADBR); e o secretário de Direitos Autorais e Intelectuais do Ministério da Cultura (MinC), Marcos Alves de Souza.
Alves de Souza lembrou que uma obra foi desclassificada do Prêmio Jabuti em 2023 porque foi escrita com o uso da Inteligência Artificial. Em 2025, o regulamento já prevê e aceita.
“É inegável que a IA Generativa utiliza obras protegidas. Para funcionar, a IA depende de energia e água para os computadores, além dos chips superpotentes, mas tem que ter dados. Ela não funciona sem ser alimentada por dados. Por isso, deve-se considerar que esses conteúdos protegidos por direitos do autor e conexos são insumos essenciais e devem ser remunerados”, defendeu o secretário do MinC.
Antes de encerrar o painel, o consultor jurídico do Sindicato Nacional dos Editores de Livros, Gustavo Martins, ofereceu o auxílio do SNEL às pequenas e médias editoras em contratos que incluam Inteligência Artificial.
* Jornalista, fotógrafa e criadora do podcast Um Oceano Delas, sobre literatura feita por mulheres.