A Câmara dos Deputados aprovou ontem (dia 6 de maio), em votação simbólica, o projeto de lei que permite a publicação de biografias de personalidades públicas sem que o autor precise da autorização ao biografado. Para passar a valer, o projeto tem ainda de ser aprovado pelo Senado e ser sancionado pela presidente Dilma Rousseff.
Atualmente, vale a regra estabelecida em 2002 pelo Código Civil. O texto em vigor estabelece que pode ser proibida “a divulgação de escritos, a transmissão da palavra, ou a publicação, a exposição ou a utilização da imagem de uma pessoa”. O projeto aprovado (PL 393/2011), de autoria do deputado Newton Lima, abre exceção para pessoas “cuja trajetória pessoal, artística ou profissional tenha dimensão pública ou esteja inserida em acontecimentos de interesse da coletividade”.
Para Newton Lima, o Código Civil de 2002 permite a censura prévia. Segundo ele, é preciso reparar esse equívoco, que vem afrontando o princípio constitucional da liberdade de expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença.
“É preciso acabar com a necessidade de autorização prévia, que vem introduzindo no dia a dia de nós brasileiros uma exceção em relação a qualquer país livre do mundo. Em nenhum país livre do mundo, a elaboração de uma obra artística, um livro, requer autorização de quem quer que seja. Isso fere a Constituição e fere a compreensão internacional de que a manifestação artística é livre”, afirmou Lima.
O projeto aprovado inclui uma emenda do deputado Ronaldo Caiado que permite uma tramitação mais rápida para pedidos judiciais de exclusão de trechos dos livros considerados ofensivos. Caso a Justiça dê uma decisão favorável ao ofendido, o trecho deverá ser retirado da próxima edição da biografia, mas não permitirá a retirada dos livros de circulação.
O próprio Caiado move uma ação contra o escritor Fernando Morais, a editora Planeta e o publicitário Gabriel Zellmeister. Ele reclama de um trecho do livro “Na Toca dos Leões”, sobre a história da agência de publicidade W/Brasil. No livro, Zellmeister afirma que, durante a campanha de 1989, quando Caiado foi candidato a presidente, o hoje deputado defendeu a esterilização das mulheres nordestinas como medida de controle populacional. A ação está na Justiça já faz dez anos.
O deputado Alessandro Molon, que relatou a matéria na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara, disse que o projeto, da forma como foi aprovado, concilia dois direitos previstos na Constituição:
“Consegue equilibrar direitos constitucionais que até há pouco apareciam em conflito. De um lado, a livre manifestação do pensamento, a liberdade de expressão, o direito do povo brasileiro de conhecer a sua História. De outro lado, o direito à intimidade, à honra e à imagem”.
No ano passado, a CCJ já havia aprovado o PL de forma conclusiva e o texto deveria ter seguido diretamente para apreciação do Senado. Porém, um recurso apresentado pelo deputado Marcos Rogério obrigou que a matéria fosse submetida ao plenário. Desde então, o PL aguardava para ser votado. Após a aprovação do projeto também pelo plenário, o deputado Marcos Rogério discordou do resultado e defendeu que o Judiciário deveria decidir sobre o assunto.
“Quem deve decidir qual direito deverá ser assegurado é o juiz. Não cabe à lei dar prevalência a um direito em relação ao outro”, disse Rogério.
Para Molon, não existe democracia que se fortaleça sem conhecer sua História:
“É direito do povo conhecer as pessoas públicas que construíram a nossa História, que contribuíram para que o Brasil se tornasse aquilo que ele é, como intelectuais, artistas, pensadores, pessoas de vida pública, parlamentares, esportistas”.
Fonte: jornal O Globo