Ao contrário do que se tem apregoado, o livro digital não é uma ameaça ao setor editorial, mas um dos seus atuais fatores propulsores. Essa é uma das conclusões da pesquisa “Crescimento da indústria editorial de livros do Brasil e seus desafios”, apresentada no último dia 21 de maio, na sede do Sindicato Nacional dos Editores de Livros, no Rio de Janeiro.
O trabalho é fruto de uma parceria do SNEL com o Coppead, instituto de pós-graduação e pesquisa em Administração da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Durante dois anos, o Sindicato patrocinou, sob a forma de uma bolsa de mestrado, o estudo, que representou a primeira investigação do mercado editorial brasileiro feita pelo Coppead. A pesquisa foi realizada pelo Mestre em Adminsitração Leonardo Bastos da Fonseca, sob coordenação da professora Denise Fleck.
Ela abriu o evento observando que uma indústria como a editorial brasileira, quanto mais cresce, mais complexa fica e que a forma como os desafios do crescimento são trabalhados vai determinar o sucesso do setor.
Na sequencia, o pesquisador expôs da diferentes fases pela qual a indústria nacional do livro passou até chegar no momento atual, onde ele percebe que o livro digital proporciona novas condições para o desenvolvimento do setor ao oferecer uma nova forma de desempenhar a função de distribuição. Segundo ele, o mesmo papel terá o processador de texto e desktop publishing software e a impressão sob demanda, que irão proporcionar novas formas de desempenhar, respectivamente, as funções de criação e seleção de obras a serem publicadas – as principais funções da indústria editorial.
O trabalho aponta essa conclusão após estudar os 200 anos da história do setor, no país. Segundo Bastos da Fonseca, essa indústria começou cheia de elementos limitantes que foram aos poucos sendo eliminados até chegar à fase atual, a que mais apresenta elementos propulsores. Dentre os elementos limitantes estão a pirataria – já nos primórdios da indústria editorial – censura e inflação.
O estudo mostra, porém, que a presença de fatores propulsores, por si só, não poderão garantir o crescimento do setor se alguns “nós” não forem desatados. Dentre esses nós a pesquisa citou a dificuldade de aprender com a experiência, a falta de processos sistêmicos de análises de dados e o baixo nível de integração e colaboração da cadeia produtiva do livro por conta da competição e padronização de ações.
Na segunda parte do evento, a presidente do Sindicato Nacional dos Editores de Livros, Sônia Machado Jardim, abriu os debates observando que a pesquisa tem por objetivo apontar mais pontos para reflexões do que elencar soluções:
“Uma possível mudança na lei do direito autoral, o livro digital sem tratamento tributário e impostos como a Cide são pontos que atualmente impactam o setor. Um desafio para o futuro, sem dúvida, será melhorar a gestão da complexidade e avançar no sentido de aumentar a integração da cadeia produtiva. Esquecemos a visão inicial de conjunto que o setor já teve e o ambiente se tornou de queda de braço”, afirmou Sônia Machado Jardim.
Vice-presidente do SNEL, Roberto Feith incluiu entre os obstáculos enfrentados pelo setor a censura às biografias. Ele observou, porém, que apesar de todos os obstáculos, a indústria editorial brasileira perseverou e cresceu. Na sua opinião, isso é um reflexo de que essa indústria atende uma necessidade do cidadão por lazer, cultura e saber e nisso reside, segundo ele, a “grande força” do setor.
Feith comemorou o fato de pesquisa mostrar o livro digital como fator propulsor da indústria:
“Normalmente, analistas colocam o livro digital como trava para o setor, quando se trata de uma grande oportunidade para a indústria editorial. O livro digital está contribuindo para a rentabilidade das editoras. Nos Estados Unidos, eles representam 25% das vendas, enquanto na Europa é de 10%. O crescimento eterno do digital está claro que não vai acontecer, como já foi apregoado. O livro digital vai acarretar novos modelos de negócio e mudanças de paradigma”.
Gerente de produtos da livraria Saraiva, Daniel Louzada acredita que a chegada do Vale Cultura pode representar uma boa oportunidade para o setor. Ele informou que a Saraiva pretende sistematizar o perfil do leitor que utiliza o Vale Cultura para compra de livros e que essa informação pode vir a ser útil para as tomadas de decisões.
Ele criticou o excesso de lançamentos “que faz com que o ciclo de um livro seja cada vez mais abreviado”: “Livros com potencial de venda acabam soterrados pelas grandes apostas. É preciso que exista um projeto para cada livro. Hoje, há uma substituição de títulos em busca do sucesso”, disse Louzada.
Participaram do evento representantes de diversas editoras como Jorge Zahar, Casa da Palavra, Sextante, Brinkbook, GMT, Objetiva, Record, Fiocruz, Valentina, Guanabara Koogan, FGV, Vozes, Lamparina, Paz e Terra, Ali Celestino, Forense, dentre outras, além das livrarias da Travessa e da Vinci. Também estiveram presentes ao seminário o diretor do Coppead, Vicente Ferreira, e representantes do Ministério da Cultura; dos deputados Alessandro Molon e Fátima Bezerra; das secretarias de Educação do Estado e do Município do Rio de Janeiro; do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Federação das Indústrias do Rio de Janeiro (Firjan), Rio Negócios e Imprensa Oficial, além das seguintes entidades do livro: Associação Brasileira de Direitos Reprográficos (ABDR), Associação Brasileira de Editores de Livros Escolares (Abrelivros), Instituto Pró-Livro (IPL), Associação Brasileira das Editoras Universitárias (Abeu) e Pasta do Professor.
A íntegra da pesquisa está disponível no site do SNEL